quinta-feira, 27 de abril de 2017

Infância

Quando eu era uma criança uma das frases que eu mais refutava era: ‘’a infância é melhor fase da vida’’. Não sei muito bem porque eu tentava, sempre, denegrir este pensamento –talvez porque eu apenas queria ser rebelde-  e não prestava realmente atenção em sua essência absolutamente verdadeira. O que acontece hoje é que sou um eterno saudosista da infância, justamente por ser a época mais inocente e genuinamente feliz que um ser humano pode ter. Não consigo olhar crianças sem pensar o quão bom era ser um garoto de um metro e tantos, de como era bom ser um mágico do cotidiano: todas as situações poderiam se transformar em brincadeiras; de como era bom não se preocupar com contas ou com o envelhecimento. Sobretudo, era bom sentir que tudo era uma aventura e o desconhecido era também uma aventura, a ser desbravada, claro. Ser inocente, transparente e verdadeiro era outro barato: se gostasse de dinossauros, os defenderia até a morte e, se preciso fosse, sairia no tapa. 

Uma criança é uma absoluta mágica, como já falei, porque consegue transformar qualquer sentimento em maravilha, e glorificar as pequenas coisas de um modo que nenhum adulto jamais conseguirá. Nunca vou me esquecer do dia que eu só tinha um avião de papel para brincar e, ainda assim, foi um dos dias mais divertidos que tenho na memória. A mente fascinante e fascinada de uma criança é um espetáculo à parte, sua natureza impressionável, seu senso de maravilhamento constante. Por falar nisso, também, houve um dia em que descobri que quando completasse 13 anos eu viraria um lobisomem:

- Meu Deus do céu – falava para mim mesmo, gelado, sentindo meu inevitável destino de homem-lobo.

Não sei porque, mas eu tinha tanto medo de lobisomens que embasbaquei que viraria um deles quando completasse 13 anos, como dizia na lenda. Esqueça o fato de que a lenda por vezes dizer que um lobisomem é um homem que foi mordido por outro lobisomem, ou que é um filho que nasceu depois de seis filhas -e que por isso é amaldiçoado-; para mim não interessava: eu viraria um deles, só restava aceitar o destino.

- Meu Deus do céu! Não tem volta! Agora é só com tiro de bala de prata no coração pra acabar com essa loucura! – desesperava-se eu, ao descobrir como se para um lobisomem.

Devo dizer, por desencargo de consciência, que eu era uma criança impressionável, talvez um pouquinho acima do tom das demais crianças. Era tudo por causa que eu vivia em um mundo de maravilhas, e –talvez- porque, às vezes, acreditava em algumas bobagens. Mas, por Deus, não! Quem disse que lobisomens são bobagens?!? São uma questão pública, isso sim! Justamente por isso, mantive-me amedrontado por anos, sempre fugindo das noites de lua-cheia, e esperando o dia do meu 13º aniversário: o dia da prova final.  Talvez tenha sido um pouco frustrante não ter me tornado um lobisomem na primeira lua-cheia após meu aniversário, prefiro pensar que sou, sim, um lobisomem e ainda não descobri (os homens que se transformam em lobisomens perdem a memória da noite anterior).

Hoje, com vinte e um anos, penso que sou um absoluto imbecil de ter denegrido aquele pensamento, ele não podia ser mais certo. Entretanto, mesmo querendo ser um adolescente logo –e um adulto logo-, eu vivi a infância e simplesmente esqueci que um dia seria um adulto, e isso foi uma absoluta bênção. Eu daria tudo e pagaria tudo para poder, apenas um dia sequer, voltar a ser criança. A infância é um presente que recebemos ao nascer e que depois temos que passar adiante sem nem mesmo perceber. Não consigo ver Stranger Things sem me emocionar.

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