terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Eu, o Devasso

Luis Fernando Verissimo é um dos poucos escritores de quem compro o livro sem sequer olhar o título, ele é um daqueles mestres em que o nome ou a sinopse da obra pouco importam, tem de se tê-la. Verissimo foi um dos autores que fez minha infância, que moldou minha percepção do cotidiano e lapidou meu senso de humor, e como agradecimento, eu só poderia ler mais e mais coisas dele. Coleciono suas obras desde a infância, mas busco compra-las com lentidão, para que nunca acabem, fato tal que fiz com excelência, é verdade. Um dia desses tratei de comprar dois livros dele de uma vez só, por estarem em uma apetitosa promoção, a qual não podia rejeitar. Mal vi os títulos, apenas olhei-os uma vez, para saber se os tinha ou não, e como não, me dirigi logo ao caixa. A atendente começou a passar os livros e a me encarar com uma feição estranha, um rosto de desgosto, uma reprovação interna. Eu logo achei esquisito da parte dela olhar-me assim e confesso que me passou pela mente desferir-lhe um ‘’algum problema?!?’’ mais grosso que parafuso de patrola. Contudo, a grosseria é uma arma que deve ser usada com cautela e sabedoria, jamais solta a bel-prazer, e por isso decidi simplesmente não entender a situação, cada um com seus problemas, afinal. Porém, enquanto passava meu cartão, olhei o visor do computador que expunha a minha compra, com os respectivos descontos e adornos, e reparei que os dois livros se chamavam ‘’Orgias’’ e ‘’Sexo na Cabeça’’, e subitamente tudo fez sentido: não tinha jeito, era oficial, na cabeça da atendente, eu era um legítimo devasso.

Saí da loja quase que rindo da situação engraçada; que peculiar coincidência, meu caro Watson! Parece que até quando não sabe, Luis Fernando me arruma situações engraçadas para ornamentar meu cotidiano e gerar, talvez, alguma crônica.  Quiçá seja ele um mago, ‘’O Oráculo do Guaíba’’, porque Delfos não é nada perto do Gasômetro. Quanto à atendente, seja lá o que estivesse pensando, restou-lhe a recordação de um ninfomaníaco estranho, que ao invés de procurar bordéis vai atrás de literatura; afinal, o descrito por outros é melhor do que o feito por si mesmo. Uma raça peculiarmente nova, deveras. 

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