sábado, 3 de dezembro de 2016

Capitão Fantástico



O último grande filme que me fez –realmente- pensar foi Her, de Spike Jonze. A obra-prima estrelada por Joaquin Phoenix é uma daquelas reflexões sobre relacionamentos que englobam uma mensagem que permeia tanto impacto visual quanto lírico. De 2014, ano em que assisti ao filme, para cá, não encontrei obras cinematográficas tão tocantes quanto à de Jonze, no sentido de possuírem a capacidade, assim que sobem os créditos, de me colocar em absoluta reflexão sobre a vida e seus delineares. Para a salvação de meus momentos reflexivos, ''Captain Fantastic'' se trata de um destes casos.

É difícil escrever algo resumido um filme tão singular e com tanto conteúdo apresentável, mas me arrisco: ‘’Captain Fantastic’’ versa sobre ciclos, sobre responsabilidades, sobre aceitação. Diversas temáticas são tratadas ao longo da trama, desde paradoxos pertinentes quanto ao modelo de sociedade em que nos inserimos, até à maneira de como aceitar a realidade, derivada deste mesmo modelo social. Não intuito revelar absolutamente nada do enredo deste trabalho, ele é uma experiência que deve ser usufruída sem ''pré-conhecimentos'', mas é extremamente difícil encontrar filmes por aí que consigam tratar de forma tão equilibrada a quantidade de ironias, críticas, e autoavaliações, presentes em ‘’Captain Fantastic’’. O trabalho abraça, absolutamente, as contradições e hipocrisias inerentes de nosso viver, que brotam e se multiplicam à medida que conhecemos e propagamos novos discursos. E este é, justamente, o mérito do filme. Ele não é uma propaganda à ideologia ou ações de Ben, personagem de Viggo Mortensen e condutor principal da trama, mas ao mesmo tempo não defende a postura, diametralmente oposta, de Jack, personagem de Frank Langella, seu ''adversário'', por assim dizer. ‘’Captain Fantastic’’ preocupa-se em demonstrar os problemas, incoerências e devaneios da sociedade capitalista que nos permeia, mas, sobretudo, de nós mesmos. Há um claro, choque discursivo, sim, entre o núcleo de Ben e o de Frank, que vai desde a percepção, de cada um, de como se deve educar um filho –e as claras consequências disto-  até de como devemos lidar com a perda. Mas a inquietação que fica disto tudo é: até que ponto nossas escolhas serão sempre nossas? Será que não chegará uma hora que, ao impactar sobre os outros, elas não mais serão somente nossas?

E como lidamos com a dor da perda, aliás, é uma das grandes mensagens de ‘’Captain Fantastic’’,  e talvez a ‘’pré-cena ‘’ final do filme, absolutamente linda e emocionante, ilustre quase que perfeitamente isto. Há uma importante reflexão sobre este tema na obra de Matt Ross, que, acertadamente, não coloca um ponto final na questão, deixando-a em aberto. Não é a função do filme discutir isto, a sua função reside em, simplesmente, mostra-la; o que vem daí para a frente cabe a nós mesmos, telespectadores. Viggo Mortensen -merecedor de um reconhecimento muito maior do que possui- e sua turma nos brindam, de lambuja, com atuações fantásticas, que juntamente com as locações lindíssimas mostradas ao longo do filme, são um verdadeiro show.

Por nos incitar a pensar e aprender, colocar o dedo na ferida, e ajudar-nos a fazer a autocrítica, ''Captain Fantastic'' merece cada segundo de seu tempo, além de um sincero e gratuito ‘’obrigado’’, destinado, sempre, às grandes obras do cinema. Mas nunca foi sobre cinema, sempre foi sobre a vida. 

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