domingo, 9 de outubro de 2016

Aos meus avós


Vez ou outra, gosto de imaginar alguns sonhos que gostaria de sonhar. Fico imaginando situações mirabolantes, trajetórias gloriosas e finais épicos (sempre felizes, claro). Já que sonhar não custa nada, mais legal ainda é sonhar como seria o sonhar. Evidentemente, muitas vezes meus ‘’projetos’’ de sonhos não são realizados, algo que provavelmente Freud deve explicar. Contudo, tenho um projeto de sonho específico que constantemente fito, e ele é relacionado ao meu avô, Juca. Eu nunca conheci meu vô Juca, ele faleceu um ano antes de eu nascer, entretanto, os relatos constantes sobre sua personalidade e feitos aumentam cada vez mais a admiração que tenho por ele. Em meu ‘’sonho-que-não-é-sonho’’, me encontro sentado em um banco, dentro de um parque bem verde, aparentemente sozinho. Olho para os lados: ninguém aparece, até o vento parece ter tirado uma folga. Um silêncio formidável se instaura, somente quebrado, periodicamente, por um barulho das águas de algum riacho próximo, que não sei onde está. Sinto-me totalmente sozinho -porém não atormentado por isso- e quando olho para minha esquerda, vejo meu avô sentado do meu lado, usando sua bonita camisa grená abotoada. Nós nos olhamos durante alguns segundos, eu falo alguma coisa (me conhecendo, provavelmente eu iria pedir alguma ajuda) e ele não responde, só olha. Seus olhos transmitem tranquilidade, assim como nas fotos que nós temos dele, e depois de me ouvir, ele apenas sorri e coloca sua mão direita perto da minha nuca, me dando um leve aperto. Esse aperto, gosto de pensar, seria a mensagem dele de ‘’aguenta firme, filho’’ ou ‘’segue em frente mesmo assim’’. Logo depois ele some, quando me distraio e olho para a direita. Acho que essas dramaticidades são necessárias para a que o ‘’sonho-que-não-é-sonho’’ seja um potencial candidato a sonho, não?

Apesar de nunca ter tido nenhuma lembrança com meu avô, gosto de colocar esse projeto de sonho como uma lembrança que tenho dele. As lembranças boas são como moedinhas de ouro dentro de um baú abarrotado de coisa, que somos nós. Bom, dentro de mim, as melhores moedas de ouro são relacionadas aos meus avós. Lembro do cheiro do sofá e da sala do apartamento do vô Fiorindo e da vó Maria, e dos gritos tilintantes do papagaio da vó, que mais fazia isso do que falava. Lembro de eu e vô Fifí indo comprar picolé em algum calor de tarde em Porto Velho, numa padaria que ficava perto de casa, e dele falando para eu não comprar o picolé de manga, que não consegui terminar. Lembro da vó Maria me dando dois reais e me parabenizando só por eu ter aparecido numa gravação de aniversário da minha prima, na qual teimava em não aparecer (fato que já estava me deixando louco). Lembro também da grande porta de madeira da entrada do apartamento da vó Pierina, na esquina com o Zin, e de como ela berrava com meu tio dizendo ‘’Mané, você não vai dar comida pra esse piá?’’; e de como ela ficava feliz quando comíamos bastante. E por fim, lembro-me deste sonho feito por mim mesmo com o vô Juca, que mesmo que não tenha ocorrido, não é por isso menos real.


Das moedinhas que tenho dentro do baú que sou, as dos meus avós são as que melhor cuido. Devo muito mais que minha existência a eles, devo uma história, e é por isso que uma parte de mim sempre estará com eles. E isso, eu não deixo ninguém tirar deles. Aos meus avós, meu mais profundo e sincero ‘’obrigado’’.

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