Roger não passava no apartamento dos pais há semanas. Mas naquela quinta de manhã decidiu ver como as coisas andavam antes de partir para o trabalho. Encontrou a mãe sentada à mesa da cozinha, fazendo palavras-cruzadas:
- Tomou café sozinha, mãe? Cadê o pai?
Nem recebeu um olhar de volta:
- Ih, nem fala. Acordou felino hoje. Tá lá no
quarto, fechado.
Roger estranhou, decidiu dar uma olhada em seu
pai, apesar do aviso. Não estava preparado para o que viu e ouviu: um quarto,
completamente escuro, um rugido ensurdecedor e olhos amarelados vindo raivosos
em sua direção.
Desesperadamente, fechou a porta e correu até a
cozinha. Aos berros, voltou a interpelar sua mãe:
- Mãe!! Quando tu disse que ele acordou
"felino" eu pensei que tivesse acordado, sei lá, com a língua afiada.
Mas não, pelo amor de Deus, que ele tinha virado uma ONÇA!
A mãe calmamente retrucou:
- Ah, língua afiada esse aí tem desde 1957...
Roger não se continha:
- Você não tem noção do que está acontecendo?
Ele virou um animal selvagem!
- Animal selvagem? E quem quebra todo o jogo de
pratos do vó Lourdes porque a geleia tá no pote errado é o que?
Silêncio de dois minutos:
- Então tu não tá nem aí? É isso? Vai deixar teu
marido há 50 anos assim? Eu preciso de uma água...
A mãe levantou-se, deu um copo de água gelada a
Roger, e o posicionou numa cadeira:
- Veja bem, meu filho. Eu falei com a Neuza, que
falou com a Ivane, que falou com o fisioterapeuta dela. É só largar um 1 quilo
de alcatra três vezes ao dia e deu pra bola.
- Meu Deus do céu, mãe... - Roger, ainda em
choque.
- Olha, pra ser sincera, eu nem vejo muita
diferença... E agora ele me dá até menos trabalho.
Roger fitou-a, rapidamente, como se tivesse um
ás na manga:
- E se ele sair do quarto? Daí tu tá morta!
A mãe riu-se:
- Teu pai? Sair do quarto? Ele só foi ao teu
batismo porque naquele dia a gente ia almoçar fora.
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