O espaço pulsava e pulsava. Os corpos, em êxtase, davam
graças ao amor derivado do conteúdo de uma garrafa de cerveja. A música eletrizava as pessoas, que dançavam de forma ininterrupta, como se o
fim estivesse próximo. E a noite caindo dava o toque final, já que contrastava abruptamente com as luzes coloridas lançadas pelo DJ. Este ritmo envolvente
daquela festa de fins de setembro era propício aos que se propiciam e doloroso
aos que se recolhem. Da gangue dos recolhidos fazia parte Duda, garoto
simpático, mas estático. Durante muito tempo Duda fora um sujeito retraído ao
extremo, pouquíssimo comunicativo. Não à toa, seu primeiro namoro ocorreu
somente aos dezoito e mesmo explorando novos universos, como o da universidade,
parecia que uma parte daquela retração emocional jamais o abandonaria. É por
isso que Duda não conseguia se conectar ao ritmo daquela festa e era por isso
que se envolvia profundamente e devotamente a todo novo encanto feminino
que lhe parecia promissor. Durante uma hora
Duda permaneceu bebendo, junto de amigos (todos homens), lamentando sua
incapacidade de ser atraente às mulheres daquela e de outras festas. Duda não
era feio, pelo contrário, mas sentia que era.
Mixando todo esse sentir com a bebida, Duda envolvia-se ainda mais com a
desolação, com a depressão de não ter o que queria. Como era de seu praxe em
ocasiões assim, tentava embebedar-se, mas nesta festa, de alguma forma, todas
suas tentativas foram inúteis. Decidiu, portanto, procurar alguma menina ideal,
provindo do recanto mais brilhante e imaculado de seus sonhos. E achou.
Ela dançava sem parar. Segurando seu copo de vodka com
energético, mantinha seus olhos fechados e se remexia, num ritmo lento mas
compassado, parecendo estar em um estado de transe. Duda não conseguiu não se
embasbacar. Ela fazia um show próprio, um show lento e sincero de relaxamento,
de leveza. Parecia que esta leveza, que faltava tanto a Duda, dissipava-se pelo ambiente,
penetrando nos outros ao redor. Ela não estava ali por alguém ou por algo,
estava por si mesma, e era por isso que mantinha seu delicado, lindo e
fascinante show lento. Era definitivo,
era a nova paixão de Duda. Era aquilo, somente aquilo. Plantou-se por perto
dela, mantendo nela seus olhos de lince sem cessar e tentando se adequar a seu show.
Contudo, sua rigidez e sua total preocupação quanto ao que os outros iriam
pensar inibiam-o de entrar naquela atmosfera. Tentou e tentou, mas não
conseguiu. Tentou beber mais, não adiantou. Pediu que um milagre caísse do céu,
não caiu. Tudo que lhe restava, pensava, era continuar por perto, tentando
criar alguma ilusória coragem, que sabia que não criaria, e abordá-la. Seus
amigos continuavam ao seu lado, chorando as mesmas milongas e também achincalhando
suas próprias impotências. O relógio, que não perdoa quem empaca, continuou sua
jornada e os minutos foram passando. Notando isso, Duda pensava que se pudesse
pararia o tempo, pararia tudo. Pararia a música, a dança, as pessoas. Se
pudesse, deixaria todos congelados. Destarte, aproximar-se-ia dela, passaria a
mão sobre sua face macia e aveludada e a abraçaria com devoção, para que o
momento não fosse esquecido jamais. Ficou assim, fantasiando e fantasiando. E
ela, dançando.
De uma hora para outra seu devaneio foi destroçado. Voltou à
realidade e deu-se conta que sua hora já havia passado, outro havia tomado o
lugar que tanto desejara. O show dela foi interrompido por alguém que ousou
quebrá-lo e que, por isso, ganhou um beijo. Os olhos vidrados de Duda não
conseguiam mirar outra coisa além dos dois e sua boca começava a amargar.
Abaixou a cabeça por um segundo, botou as mãos na cintura e enquanto o mundo
todo pulsava ao redor, permaneceu assim. Seu amigo Pablo, sentindo o
desconforto, deu-lhe um tapa leve nas costas e disse:
- Vamos embora?
Duda concordou. Assim, ele e seus amigos se
dirigiram à saída, entraram no carro de Pablo e perderam-se no horizonte. Eram
nove horas.